EDIFÍCIO JOSÉ DOMINGOS: O TRIO ELÉTRICO FOI O PRIMEIRO RESIDENCIAL DA CIDADE

14/5/2025, 8:50 | Fotos: Arquivo Pessoal
A coluna Feira em História, assinada pelo jornalista Zadir Marques Porto, traz fatos históricos e curiosos sobre a cidade

Serenamente plantado na Rua Visconde do Rio Branco, ele viu a cidade se modificar e crescer. Primeiro residencial de Feira de Santana, o Edifício José Domingos é um memorial da audácia e persistência do sergipano que, aqui chegando, pode-se dizer, sem nada, conquistou lugar e respeito na sociedade com trabalho e honestidade.

A construção do Edifício José Domingos – o primeiro residencial da cidade, na Rua Visconde do Rio Branco, em 1970 – não foi apenas um desafio para o sergipano José Domingos Servo, que ele mesmo provocou, mas uma vitória que provou a capacidade de um homem ruralista, de pouca instrução escolar, mas de uma enorme vocação para os negócios, determinação e vontade férrea de trabalhar e progredir, ao mesmo tempo em que, com a sua ação abrangente, contribuía diretamente para acentuar o desenvolvimento da Cidade Princesa.

José Domingos Servo nasceu em Portica, no município de Itabaianinha, Sergipe, filho de agricultores e, como tantos outros jovens da sua geração, com um futuro pouco otimista. Em uma fazenda vizinha nasceu a jovem Maria Lucia Silva. Conheceram-se na infância e casaram-se cedo: ela com apenas 13 anos, ele 10 anos mais velho. Há quem acredite em destino ou que a vida de cada um de nós venha programada, tal como um roteiro de filme; outros, não. Mas o interessante é conhecer cada capítulo antes de fazer deduções.

José Domingos sabia o que queria e assim resolveu vir para Feira de Santana, não apenas uma cidade muito maior que a sua terra natal, mas extremamente acolhedora e dotada de um cenário próprio para o que ele queria: trabalhar e crescer. Na Cidade Princesa, começou na Rua Visconde do Rio Branco, na época chamada de Rua da Cadeia, já que ali ficava a Cadeia Pública Municipal, hoje Câmara de Vereadores.

O primeiro negócio foi a venda de objetos de cerâmica da região de onde ele procedia, mas pouco conhecidos entre os feirenses. Uma rápida passagem pela Rua Marechal Deodoro e a volta para a Visconde do Rio Branco, que sediou seus passos positivos no comércio. Nessa artéria central da cidade, arrendou uma área de terra da professora Diva Matos, mãe do intelectual Eduardo Matos, que foi Ministro da Educação, e ampliou o comércio, ao tempo em que adquiria um caminhão.

Enquanto sua jovem esposa administrava a loja, ele fazia o transporte de passageiros para cidades da região, no chamado ‘pau de arara’. Embora tendo dúvida em relação à marca do veículo do marido, dona Maria Neuza Silva Servo lembra bem: “Era um caminhão de cor azul”. Na década de 1950, o transporte de passageiros, como de mercadorias, era extremamente deficiente e, em pouco tempo, José Domingos foi ampliando o número de caminhões, chegando a ter uma frota de 10, o que significou também emprego para parentes e amigos vindos do interior sergipano.

Se Feira de Santana tinha sido tão acolhedora para ele, o mesmo ele fazia com pessoas vindas da sua região. Sua filha Maria Lucia Silva Servo lembra que, em 1956, “tinha dias de nossa casa contar com 10 pessoas oriundas de Sergipe, 10 camas ocupadas. E nós éramos felizes com isso”, relata. Na caminhada marcada pelo trabalho incessante, José Domingos adquiriu um imóvel na Rua Intendente Rui, ao lado da Associação Atlética Feirense (AAF), abrindo um bom estabelecimento comercial, o Armazém Sergipano, que ganhou filial em Salvador, em Água de Meninos.

Assim, além da Casa da Louça Sergipana na Rua Visconde do Rio Branco, ele também foi um grande distribuidor de açúcar, teve uma cerealista, um moinho de sal e uma fábrica de colchões de capim. Sempre ligado às origens, investiu na agropecuária adquirindo muitas terras na região de Iaçu e Machado Portela. Mas seu maior projeto estava para ser realizado e só demorou um pouco mais do que ele desejava, porque a compra da casa onde o Edifício José Domingos seria construído foi retardada. “Meu pai levava o dinheiro para comprar a casa e dona Iazinha Mota subia o preço. Isso aconteceu quatro vezes, mas, por fim, ele comprou”, relata Maria Lucia.

O Edifício José Domingos, construído em 1970, foi o primeiro residencial de Feira de Santana. Com 21 apartamentos e 30 salas em dois pavimentos e ampla área térrea como garagem, obteve verdadeiro sucesso, logo sendo ocupado por médicos, advogados, empresários, juízes, professores, que integravam a elite social e, como ficava feericamente iluminado, era chamado o “edifício trio elétrico”.

Poderia realizar muito mais e assim desejava, mas faleceu jovem, aos 53 anos de idade, em São Paulo, em tratamento de saúde. Dona Maria Neuza deu-lhe cinco filhos: José Valter, Maria Lúcia, Liége Maria, José Domingos Filho e Jorge Mário, os dois últimos falecidos. Tratada com extremo carinho pelo pai, “Ele me protegia até demais, parece que tinha ciúmes. Para eu ir a uma festa, um irmão tinha que me acompanhar”, lembra com saudade Maria Lucia, ressaltando a paixão do pai pelo Fluminense de Feira.

“Meu pai não perdia jogo do Fluminense no Joia. Ajudava a diretoria, tinha cadeira cativa, assim como eu. Íamos aos jogos, ele se encontrava com amigos”, rememora. José Domingos não tinha definição partidária e jamais quis ingressar na política, apesar de convites, mantendo perfeito relacionamento com integrantes da ARENA e do MDB e os ajudando. Ao lado da mãe e sem esconder a emoção, Maria Lucia Silva Servo agradece a Feira de Santana pelo acolhimento ao seu pai, que retribuiu com muitos anos de dedicação e trabalho para o crescimento da cidade.

Por Zadir Marques Porto

 

 



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