Manoel da Costa Falcão e o "discurso que não foi lido"

2/10/2017, 14:41h | ARQUIVO

No livro “Memórias de um Comendador”, são quatorze páginas dedicadas a “Fatos Pitorescos”, narrados por Jonathas Carvalho, envolvendo pessoas de suas relações de amizade. Vale a pena lembrar um deles, envolvendo Manuel da Costa Falcão, empresário que comandou o Centro das Indústrias e vereador que chegou a presidência da Câmara Municipal (Adilson Simas).

FATOS PITORESCOS
Jonathas Carvalho

A vida para que seja bem vivida necessita que seja ponteada de acontecimentos que deixam marcas que a engrandecem e a tornam alegre e salutar. E durante a minha não tem sido diferente! Sempre procurei fazer do meu ambiente de trabalho um local o mais agradável possível, e procurei transformar os servidores ou funcionários numa verdadeira família. Para descontrair, por vezes, eu aprontava das minhas, tornando ameno o peso do trabalho, mas – esclareça-se! – sem perder a ética e o respeito aos outros.

Sempre foi assim: onde estou, procuro tornar o ambiente agradável. Evidente que sempre me limitei a fazer brincadeiras com amigos e pessoas de minha intimidade. Estas compreendem e se divertem com o lado pitoresco de cada situação: Vejamos alguns.

O DISCURSO QUE NÃO FOI LIDO - Manoel da Costa Falcão, nosso conhecido Manezinho Falcão, filho de João Marinho Falcão, era uma figura muito querida e respeitada. Bem relacionado nos meios políticos e sociais, com sua influência, conseguiu junto a um amigo que exercia as funções de Diretor do SENAI em Salvador, a vinda de uma unidade desse órgão para a nossa Feira de Santana.

Concluídas as obras das instalações, havia a necessidade de serem inauguradas. E para tanto teve de preparar uma linda festa, prestigiada com a presença de autoridades e o povo em geral. Manezinho estava todo prosa, empolgado com o empreendimento que sua cidade iria receber.

Chegou o grande dia. Palanque armado, presenças confirmadas, Manezinho com o  “improviso” no bolso do paletó, aguardava o convite do mestre de cerimônias para o seu justo, merecido e oportuno pronunciamento. Ele não perdia oportunidade para mostrar a sua eloquência, resultado de anos de estudo e dedicação às regras da boa oratória. E a plateia gostava de ouvi-lo. Naquele dia estavam presentes o governador do Estado, diversos Deputados, Diretores do SENAI. O povo feirense sempre prestigiando tais eventos, lotava toda a área em frente ao palanque. Eu me encontrava ali, junto ao nosso orador. Percebi, então, que sua peça de oratória estava à vista, no bolso do paletó e, no empurra, empurra, todos queriam uma posição privilegiada para isto trocando cotoveladas e pequenos encontrões.

Aproveitei o descuido de Manezinho, este com os olhos fixos no mestre de cerimônia, aguardando o chamado desse para usar a sua vez de falar, e enfiei os dedos, indicador e o médio no paletó conseguindo “pescar” sorrateiramente o “improviso” do meu amigo orador. E saí de fininho, tratando de desaparecer da vista do orador.

Quando chamado, o eloquente tribuno, depois de saudar as autoridades e ao povo, meteu a mão no bolso para tirar o discurso e gelou: Cadê a peça literária? Aí, a coisa ficou cômica: Manezinho, nervosamente, remexia todos os bolsos, puxando-os para fora em desespero, enquanto a população ria gostosamente. Mas o orador não perdeu a esportiva: fez o pronunciamento verdadeiramente de improviso, meio vacilante e sem entusiasmo, sem graça que estava... Ao final da inauguração, estive com ele e alegando haver encontrado no chão o seu discurso. Mas ele não acreditou e me encheu de desaforos e palavrões, enquanto eu ria, divertindo-me. Entre outras coisas, me disse:

- Como é que você faz uma coisa dessas, rapaz?! Viu a minha embaraçada situação? Não fosse a minha grande experiência, tomaria uma estrondosa vaia da multidão. Mas, não tem nada, não!... Você me paga, vou à forra. Se prepare.

Manezinho nunca teve essa oportunidade e nunca mais colocou discurso no bolso do paletó. Deve ter me perdoado antes de sua partida para o reino eterno, amigos fraternos que éramos...